domingo, 28 de junho de 2015


Janio, na Folha: Lava Jato

é adutora suja que não seca

 Fernando Brito
lama
Nada como começar o domingo com a serena firmeza do mestre Janio de Freitas, que tem tempo de janela demais e dignidade suficiente para não se entregar à hipocrisia dominante, onde os atos de uns não são apontados como os de outros, embora sejam iguais .
A nossa “moralidade seletiva” funciona, diz ele, até mesmo como elemento irracionalizador do noticiário, onde a ânsia de criar episódios escandalosos atropela, se o personagem “interessa”, não apenas os limites da ética e da legalidade mas também o da própria lógica e sentido dos fatos.
Então, processo, investigação e notícia, viram um jato sujo, com que se tenta fazer um “mar de lama”, de tão dolorosa memória em nosso passado histórico.
Tudo, assim, ao contrário da serenidade e zelo que se deve ter como regra na justiça.

Janio de Freitas      Resultado de imagem para Imagem  da logo da Folha SP

Jatos que mancham

Como inquérito “sob segredo de Justiça”, a Operação Lava Jato lembra melhor uma agência de propaganda. Ou, em tempos da pedante expressão “crise hídrica”, traz a memória saudosa de uma adutora sem seca.
Em princípio, os vazamentos seriam uma transgressão favorável à opinião pública ansiosa por um sistema policial/judicial sem as impunidades tradicionais. Mas, com o jorro contínuo dos tais vazamentos, nos desvãos do sensacionalismo não cessam os indícios que fazem a “nova Justiça” –a dos juízes e procuradores/promotores da nova geração– um perigo equivalente à velha Justiça acusada de discriminação social e inoperância judicial.
É preciso estar muito entregue ao sentimento de vingança para não perceber um certo sadismo na Lava Jato. O exemplo mais perceptível e menos importante: as prisões nas sextas-feiras, para um fim de semana apenas de expectativa penosa do preso ainda sem culpa comprovada. Depois, a distribuição de insinuações e informações a partir de mera menção por um dos inescrupulosos delatores, do tipo “Fulano recebeu dinheiro da Odebrecht”. Era dinheiro lícito ou provou-se ser ilícito? É certo que o recebedor sabia da origem, no caso de ilícita?
A hipocrisia domina. São milhares os políticos que receberam doações de empreiteiras e bancos desde que, por conveniência dos candidatos e artimanha dos doadores, esse dinheiro pôde se mover, nas eleições, sob o nome de empresas. Nos últimos 60 anos, todos os presidentes tiveram relações próximas com empreiteiros. Alguns destes foram comensais da residência presidencial em diferentes mandatos. Os mesmos e outros viajaram para participar, convidados, de homenagens arranjadas no exterior para presidente brasileiro. Banqueiros e empreiteiros doaram para os institutos de ex-presidentes. Houve mesmo jantares de arrecadação no Alvorada e pagos pelos cofres públicos. Ninguém na Lava Jato sabe disso?
Mas a imprensa é que faz o sensacionalismo. É. Com o vazamento deformado e o incentivo deformante vindos da Lava Jato.
A partir de Juscelino, e incluídos todos os generais-presidentes, só de Itamar Franco e Jânio Quadros nunca se soube que tivessem relações próximas com empreiteiros e banqueiros. A íntima amizade de José Sarney foi mal e muito comentada, sem que ficasse evidenciada, porém, mais do que a relação pessoal. Benefícios recebidos, sob a forma de trabalhos feitos pela Andrade Gutierrez, foram para outros.
Ocorre mesmo, com os vazamentos deformantes, o deslocamento da suspeita. Não importa, no caso, o sentido com que o presidente da Odebrecht usou a palavra “destruir”, referindo-se a um e-mail, em anotação lida e divulgada pela Lava Jato. O episódio foi descrito como um bilhete que Marcelo Odebrecht escreveu com instruções para o seu advogado, e cuja entrega “pediu a um policial” que, no entanto, ao ver a palavra “destruir”, levou o bilhete ao grupo da Lava Jato.
Muito inteligível. Até que alguém, talvez meio distraído, ao contar o episódio acrescentasse que Marcelo, quando entregou o bilhete e fez o pedido ao policial, já estava fora da cela e a caminho de encontrar seu defensor.
Então por que pediria ao policial que entregasse o bilhete a quem ele mesmo ia encontrar logo?
As partes da historinha não convivem bem. Não só entre si. Também com a vedação à interferência na comunicação entre um acusado e seu defensor, considerada cerceamento do pleno direito de defesa assegurado pela Constituição.
Já objeto de providências da OAB, a apreensão de material dos advogados de uma empreiteira, em suas salas na empresa, foi uma transgressão à inviolabilidade legal da advocacia. Com esta explicação da Lava Jato: só os documentos referentes ao tema da Lava Jato seriam recolhidos, mas, dada a dificuldade de selecioná-los na própria empresa, entre 25 mil documentos, foram apreendidos todos para coleta dos desejados e posterior devolução dos demais.
Pior que uma, duas violações: a apreensão de documentos invioláveis, porque seus detentores não são suspeitos de ilicitude, e o exame violador de todos para identificar os desejados. Até documentos secretos de natureza militar, referentes a trabalhos e negócios da Odebrecht na área, podem estar vulneráveis.
Exemplos assim se sucedem. Em descompasso com uma banalidade: condenar alguém em nome da legalidade e da ética pede, no mínimo, permanentes legalidade e ética. Na “nova Justiça” como reclamado da “velha Justiça”.

Nenhum comentário: