quinta-feira, 19 de março de 2015

Jurista: é criminoso o agressor de quem usa roupa vermelha             

                                 Blog da Cidadania por Eduardo Guimarães
fascismo
Já se tornou recorrente essas pessoas que estão indo às ruas contra a presidente Dilma Rousseff e o Partido dos trabalhadores promoverem agressões físicas e verbais contra quem porte símbolo de preferência política pela presidente da República e seu partido. Desde o processo eleitoral do ano passado isso vem acontecendo.
Entre os episódios mais impressionantes, está o do cadeirante que durante a campanha eleitoral do ano passado, na capital paulista, foi agredido(AQUI) por militantes do PSDB no meio da rua por usar camiseta vermelha.
Nas redes sociais e mesmo nesta página, leitores vêm manifestando o medo em se expressar politicamente. Atualmente, sair com uma camiseta vermelha na rua em lugares como São Paulo, por exemplo, gera risco de agressão física de potencial imprevisível, até com risco de morte.
O Blog da Cidadania foi ouvir sobre essa questão um dos mais importantes juristas do país, o advogado Pedro Estevam Alves Pinto Serrano.
Pedro Serrano, como é conhecido, é mestre e doutor em Direito do Estado pela PUC/SP; professor de Direito Constitucional, Fundamentos de Direito Público e Prática Forense de Direito Público na Faculdade de Direito da PUC/SP; professor do Curso de Especialização em Direito Administrativo da Faculdade de Direito da PUC/SP; ex-professor de Direito Constitucional e Administrativo em diversas Faculdades de Direito no Estado de São Paulo e em cursos preparatórios para concursos jurídicos; proferiu aulas e palestras nas Escolas Superiores da Magistratura Federal, da Magistratura do Estado de São Paulo e do Ministério Público de São Paulo bem como em diversos congressos e seminários de Direito Constitucional, Direito Administrativo e Direito Público em diversas regiões do pais;
Serrano também é ex-procurador do Estado de São Paulo; ex-consultor especial da Câmara Municipal de São Paulo; ex-secretário de Assuntos Jurídicos da Prefeitura Municipal de São Bernardo do Campo e membro efetivo do Instituto de Direito Administrativo de São Paulo.
Confira, abaixo, a entrevista.
pedro serrano
Blog da Cidadania – Pessoas que têm usado roupas da cor vermelha têm sido agredidas na rua em manifestações contra o Partido dos Trabalhadores ou contra o governo Dilma Rousseff e mesmo quando não há manifestações. Como o senhor vê esse tipo de situação?
Pedro Serrano – O que não pode haver, e a Constituição determina claramente que não pode haver, é, onde há uma manifestação já agendada, um outro grupo político querer se manifestar no mesmo lugar. Outra coisa é a pessoa que, individualmente, em um dia comum, quer transitar na rua com uma camiseta do seu partido político - por exemplo, do PT – até porque de trata de um partido legal.
É absolutamente lícito você manifestar sua preferência política portando uma camiseta do PT. Não só é lícito como é um direito inerente à liberdade de expressão. Exprimir-se não é só falar, exprimir-se é você portar todos os signos de uma determinada ideia em que você acredita ou os de uma orientação política.
Agredir uma pessoa que ostenta o símbolo de uma agremiação política tem o mesmo sentido, para a ordem jurídico-democrática, de se agredir um homossexual,  um negro,  uma mulher, face a preconceito quanto a gênero,  etnia ou orientação sexual. Quem se exibe com  uma camiseta  de qualquer partido  expressa opção política a ser absolutamente respeitada, não apenas na dimensão do direito de consciência como em manifestar esse pensamento das mais variadas formas, o que inclui,  por consequência,  por exemplo,  uma vestimenta de cor vermelha.
E o dever da força policial é proteger quem manifesta licitamente  preferência político-partidária, da mesma forma quando um homossexual é agredido, e não  a multidão que o agride, reprimindo eventuais agressores. Assim quando uma mulher, agredida por um homem, por conta da sua condição feminina, faz jus liminarmente à proteção do Estado, que é obrigado a penalizar o agressor.
As pessoas que cometem tais infringências à lei devem ser individualmente identificadas, e a polícia, hoje em dia, tem amplas condições técnicas de fazê-lo. Você sabe que hoje,  em qualquer espaço público, todo mundo é filmado por câmeras de condomínio etc. Então, a polícia tem total condição de enquadrar os criminosos. E deveria agir com rigor, em nome da liberdade de expressão e da própria democracia.
– Quero lhe relatar um caso. No último domingo, dia da manifestação contra Dilma Rousseff, um indivíduo passeava de bicicleta pela orla da praia, no Rio de Janeiro, usando uma camiseta vermelha. Essa pessoa foi agredida pela multidão. Então chega a polícia. Em vez de proteger o cidadão, os policiais obrigaram o transeunte a despir a camisa vermelha ante de o levarem embora, dentro da viatura, o que deu a impressão de que esse homem estava cometendo um crime. O que o senhor acha disso?
– Eduardo, isso demonstra claramente a quem, no momento atual, a polícia e as instituições repressivas estão servindo. Em vez de servir ao direito das pessoas e à democracia, preferem, por exemplo, servir apenas à proteção de patrimônio. Quando é para proteger o direito das pessoas de manifestarem suas opiniões políticas, o que se vê é essa inércia, essa inação. Isso demonstra que nós estamos em um país que ainda tem uma democracia muito imatura.
Nós precisamos aperfeiçoar a democracia. Esse debate que você está promovendo é correto.
Temos que pressionar os órgãos de repressão para que sejam mais republicanos, que os policiais não atuem apenas em favor daqueles com os quais os seus comandantes simpatizam, mas  em favor de qualquer cidadão, porque  são pagos para isso.
– Em uma situação como essa, em que a autoridade policial não age em defesa de direitos civis como liberdade de expressão, o público com o qual eu interajo na internet, em boa parte está se dizendo com medo de manifestar suas opiniões políticas. Essas pessoas estão se dizendo com medo de manifestar suas opiniões políticas em ambientes profissionais, familiares e, sobretudo, no espaço público. O que é que se pode fazer para combater o que está parecendo com a ascensão do nazi-fascismo na Europa?
– Nós temos que lembrar que o fascismo e o nazismo, quando surgiram e se instalaram no poder, foram uma 'onda'. É mais ou menos o que se está vendo na sociedade brasileira.
Existe, sim, um aspecto nessas manifestações [contra o governo Dilma] que é legítimo: o deo governo ser criticado. É legítimo as pessoas exporem opiniões, à direita ou à esquerda. Eventualmente, no ambiente de uma manifestação pública,  excessos podem ocorrer e são toleráveis, dado o direito de  expressão individual.
Duas coisas, porém, têm me preocupado. Isso que você falou, sobre o ódio em relação a opções políticas, bem como a escancarada pregação do golpe de Estado, incluída uma “intervenção militar”.
O Brasil tem uma postura em seu sistema jurídico muito clara. O próprio presidente Fernando Henrique Cardoso implementou uma lei federal que torna crime qualquer tipo de manifestação, de divulgação, de exposição de ideias em favor do nazismo. Ou seja: a democracia brasileira não tolera formas  autoritárias travestidas de 'Direito'.
Acho que essa legislação, do governo FHC, tem que ser aperfeiçoada. Precisamos de uma legislação para explícita defesa da democracia. Qualquer regime político deve dispor de mecanismos de autodefesa. E a democracia aceita o debate sobre qualquer tema, menos sobre sua própria extinção.
Dessa forma, é imperioso criar  dispositivo legal destinado à prioritária defesa do regime democrático. Há que se estabelecer algum tipo de sanção, sem necessariamente o da prisão, para os pregam a derrubada do Estado Democrático de Direito.
– Há sanções na Lei de Segurança Nacional, ainda que seja uma lei de inspiração ditatorial, feita pela ditadura…
– Há, sim, essa lei, mas eu não gosto da Lei de Segurança Nacional. Acho que deveria ser criada outra, por mais que essa esteja ainda vigente.
O que é preciso é punir os crimes de ódio contra orientação sexual, gênero e opção política. A manifestação de ideias, o debate e o conflito fazem parte da democracia, que, sem tolerância, não subsistiria como regime  convivência plural.
Todos os atos que atentam  contra opção política, de gênero ou orientação sexual têm que ser severamente punidos, porque implicam  violência contra o cidadão e o regime político democrático, daí a necessidade de serem especificados sob o prisma da maior gravidade.

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