quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

O PMDB no comando e o Distritão 

Aldo Fornazieri(*)      Luis Nassif Onlineimagem de jura

A desairada condução política do Planalto e do PT conferiu ao PMDB uma força inédita. Se é verdade que os peemedebistas vinham comandando o Congresso Nacional há mais tempo, o fato é que o partido nunca teve tanta força política, nos últimos 20 anos, como tem agora. A participação que o PT tinha na mesa da Câmara e nas comissões internas nos mandatos de Lula e no primeiro mandato de Dilma estabelecia um contrapeso ao domínio do PMDB na base governista. A opção isolacionista que o PT adotou no processo de escolha da nova direção da Casa não só enfraqueceu o poder de articulação política do partido e do Planalto, como deu ao PMDB o comando da iniciativa política do país. Os peemedebistas adquiriram a condição de ditar a agenda política e econômica. Esta capacidade foi amplificada pela conduta independente que Eduardo Cunha mantém em relação ao governo Dilma.
As consequências políticas desse novo quadro se fizeram sentir de imediato: o PT ficou de fora de posições relevantes nas Comissões internas da Câmara e na Comissão da Reforma Política e Cunha impôs a aprovação do Orçamento Impositivo e ameaça convocar os ministros para prestar esclarecimentos aos deputados. Mas, às vezes, existem supostos males que vêm para o bem. Após a redemocratização o Congresso foi sempre tratado pelos presidentes da República como uma espécie de extensão do Executivo. A postura de independência de Cunha obrigará não só o governo a negociar mais, mas eliminará também os intermediários exigindo que se estabeleça uma relação direta entre o presidente da Câmara e a presidente Dilma. Isto não é nenhum desastre e pode melhorar as relações políticas entre os poderes. Se nos Estados Unidos o presidente Obama negocia diretamente com os opositores republicanos que comandam o Congresso, por que Dilma não negociaria com Eduardo Cunha e Renan Calheiros sem a intermediação de subalternos que, muitas vezes, não são traquejados para a tarefa?
Outra conseqüência política do inédito poder do PMDB afeta o PSDB. Com baixa capacidade de produzir uma oposição programática que indique um caminho alternativo ao país, o tucanato terá parcela de sua iniciativa política absorvida pelo PMDB. Essa nova circunstância já foi evidenciada quando Cunha cedeu ao DEM a presidência da Comissão da Reforma Política. Tudo indica que o PMDB começou a pavimentar seu caminho para uma candidatura própria em 2018. Para isto terá que ser capaz de construir um programa e de ungir um líder tendo em vista a superação das características regionalistas do partido, construindo sua unificação nacional.
O Equívoco do Distritão
Mas, ao apostar na adoção do chamado Distritão como principal ponto de reforma política, o PMDB mostra que não está à altura de constituir-se como um partido nacional e nem mesmo de viabilizar uma alternativa à polarização entre PT e PSDB. A proposta do Distritão é tão simples quanto equivocada. Os Estados seriam transformados em Distritos para efeito de eleição dos deputados federais e seriam eleitos os mais votados de todos os partidos. O mesmo valeria para os deputados estaduais e para os vereadores nas eleições municipais. O voto em legenda cairia, assim como o voto proporcional auferido pela soma dos votos em todos os candidatos de um partido.
A idéia do Distritão teria como objetivo corrigir o mal que ocorre quando um candidato a deputado concentra uma grande votação é consegue puxar a eleição de mais quatro ou cindo candidatos com baixa votação – como foi o caso do Tiririca. O Distritão, contudo, produz como conseqüência o fortalecimento ainda maior do personalismo, que já é forte com o atual sistema de votação proporcional com lista aberta. Os partidos sairiam ainda mais enfraquecidos.
O PMDB, partido que se articula em torno do caciquismo regional, pensa em ganhar com o Distritão elegendo um maior número de deputados. Mas o tiro pode sair pela culatra. Se o Distritão for implantado, haverá uma corrida pela filiação de personalidades públicas provenientes de fora da atividade política. Os pequenos e médios partidos, mais afeitos ao uso da política como negócio, poderão beneficiar-se nessa corrida pela eleição de famosos. Um partido com baixa organização e representação poderá eleger mais deputados do que um partido organizado e socialmente representativo. O sistema partidário e político, que já é frágil, poderá sofrer um golpe duro, agravando a crise de representação política e institucional do país. O DEM parece disposto em trilhar o mesmo caminho da irresponsabilidade política que o PMDB ensaia adotar.
Tanto o PT quanto o PSDB são contra o Distritão pela mesma razão correta: ele enfraquece ainda mais o sistema partidário. Mas as saídas que os dois partidos propõem vão em sentidos diferentes. O PT propõe o voto proporcional em lista fechada. O PSDB propõe o voto distrital. As duas propostas, com seus méritos e seus defeitos, têm a virtude de fortalecer o sistema partidário. O fato é que não existe um sistema eleitoral perfeito, capaz de solucionar todos os problemas. Não existe nem mesmo consensos mínimos para a viabilização de qualquer proposta de reforma política. Os partidos terão que negociar e debater com a sociedade visando construir uma proposta satisfatória de reforma política que seja capaz, senão de superar em definitivo, ao menos de melhorar a representação política do país. O que não dá para fazer é caminhar para trás. Evitar o Distritão já seria um ganho, pois ele é um retrocesso.
(*) Aldo Fornazieri – Cientista Político e Professor da Escola de Sociologia e Política                                    da USP.

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