sexta-feira, 18 de outubro de 2013



Libra: os números que mostram o 

equívoco de cancelar                            

Fernando Brito                                   


libraminas

Recebo um telefonema de um amigo que pede que eu explique porque sou a favor do leilão de Libra.


Fica , porém, surpreso quando lhe digo que não sou a favor do leilão, mas apenas de ganhar o leilão, porque sei, como dois e dois são quatro, que a Petrobras vai ganhar este leilão.
E porque é que sei, alguém me contou?
Infelizmente, não.
É apenas – se é que se pode chamar de “apenas”  ler e tentar interpretar todo o noticiário do setor de petróleo – a conclusão lógica do que vem acontecendo.
Quando, há dois anos, a Petrobras começou um grande programa de desmobilização de ativos – leia-se: venda de bens e direitos – e partiu para grandes captações de recursos, era sinal de que a empresa “fazia caixa” para alguma ação de grande vulto, se desfazendo de tudo o que não é estratégico ou produz caixa.
A empresa fez, também, sua mais ousada captação de recursos em um único lance: US$ 11 bilhões, em maio.
A Petrobras vai com a força destes recursos próprios para o leilão. Poderiam até ser suficientes para o lance, mas seu caixa não faria frente aos talvez 100 bilhões de dólares necessários para os investimentos nos cinco ou seis anos necessários para o campo começar a produzir e gerar receitas.
Portanto, é preciso arranjar este dinheiro.
Como?
“Ah, o Governo empresta e depois a Petrobras paga em petróleo”.
Ótimo! E como o Governo arranja dinheiro? Vende títulos ao mercado, pagando os juros que o tal mercado nos exige.
Hoje, 9,5% ao ano brutos ou 3,5% reais, descontada a inflação.
Um “cancelonista” – como chamo os que se opõem ao leilão agora – publicou ontem, como ironia, um fantasioso e-mail interceptado pela espionagem, onde a Petrobras acertaria com os chineses a forma de eles nos financiarem a exploração de Libra.
E o que era para ser uma acusação de Paulo Metri, veja só, acaba se tornando uma proposta de negócios, verdadeiramente da China, para o nosso país.
  • 1. A empresa dos Senhores, representando os seus bancos coligados, financiará a participação adicional de 20% da nossa empresa, que, assim, passa a ter 50% do capital do nosso consórcio. A empresa dos Senhores ficará com os outros 50% do consórcio.
  • 2. Este financiamento será pago com o fornecimento do nosso produto, da parcela que nos cabe, durante o tempo necessário até o abatimento completo, à empresa dos Senhores.
  • 3. As remessas mensais mínimas serão calculadas multiplicando-se o número de dias do mês por 300.000 unidades por dia.
  • 4. Sobre o saldo devedor, incidirão juros à mesma taxa da valorização das Letras do Tesouro Americano.
  • 5. Os abatimentos mensais do saldo devedor da nossa empresa terão o valor fixado em dólar com o preço do produto no mercado internacional no mês em questão.
Traduzindo: empréstimo com carência até a entrada do campo em produção, com saldo convertido em barris de petróleo (o produto), a taxas de juros do Tesouro americano – hoje, de 0,25% ao ano! – e amortizações abatidas com venda garantida de óleo a preço cheio do mercado internacional!.
A Petrobras não consegue dinheiro assim em parte alguma! Aliás, nem ela, nem empresa alguma.
Mas o tal e-mail imaginário com que se tenta atacar o leilão de Libra ainda diz mais:
Se os Senhores estiverem de acordo com esta lista de compromissos, podemos fechar este acordo e formar o consórcio. Ainda teremos que submeter nossa proposta ao órgão regulador do Governo responsável por este setor, que só se prende, para aprovação, ao valor da taxa sobre o lucro líquido do consórcio. Portanto, seria recomendável colocarmos um percentual em torno de 65% para garantir a aprovação. Assim, seremos imbatíveis.”
Queira Deus, que aquilo que é dito para criticar possa acontecer exatamente assim.
Porque 65% de oferta percentual para o Estado Brasileiro dá um resultado bárbaro de receita para o poder público. Veja o que aconteceria na participação estatal com uma oferta assim e o barril a 100 dólares:
Receita bruta por barril (A) US$ 100
Royalties (B=15%*A) US$15
Custos de Extração (C)  US$30
Receita líquida (D=A-B-C) US$ 55
Óleo Governo (E=65%*D) – US$ 35,75
Óleo Consórcio (F=D-E)  US$ 19,25
Imposto Renda (G=25%*F)   US$4,81
CSLL (H=9%*F)   US$ 1,73
Lucro Final do Consórcio (I=F-G-H) US$ 12,71 (18,2%)
Fatia de Governo s/ dividendos (L=B+E+G+H)  US$ 57,29 (81,8%)
Mas isso ainda não é tudo: como o consórcio teria 50% de participação da Petrobras, metade do lucro – US$ 6,35 – pertenceria à nossa empresa. E, tendo o Governo Federal, apesar de toda a lambança feita por Fernando Henrique no lançamento dos ADRs da na Bolsa de Nova York, direito a 48% dos lucros da Petrobras, terá 48% deste valor: mais US$ 3,05.
rpp
A participação governamental total, portanto, fica em US$ 60,34 dos US$ 70 que vale o barril, ou 86,2%, claro que descontados os custos para faze-lo vir de 5 ou 6 mil metros abaixo do leito do oceano profundo.
Coloco aí ao lado uma tabela de quanto é a participação governamental em diversos países que praticam o regime de partilha puro ou associado ao regime de concessão.  Ela é parte do trabalho dos professores Sérgio Wulff Gobetti e Rodrigo Valente Serra, doutores em Economia pela UnB e pela Unicamp, respectivamente. Foi deles, também, que tirei o guia de cálculo, adaptados para aqueles valores.
Portanto, a se confirmar a “desgraça” prevista por um dos mais respeitáveis adversários do leilão, teremos uma participação governamental mais baixa – e por muito pouco – à aplicada por Hugo Chávez às jazidas venezuelanas.
Eu até acho que não chegaremos a esse ponto mas, confesso, nunca torci tanto para um adversário de ideias estar certo e o que ele prevê como desgraça de realize.
Como eu estava achando que ganhar um pouco menos se justificava para não deixar Libra “dando sopa” para a turma da privatização, fico sabendo, graças a quem não quer o leilão, que corremos o risco de nos sairmos melhor que a encomenda, como dizia a minha avó.
Por: Fernando Brito

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