sábado, 10 de agosto de 2013

O dia em que Ayres Britto defendeu o AI-5                        


Ouvi nesta sexta-feira, 9, o discurso do procurador da República Marlon Alberto Weichert, no lançamento do Brasil Nunca Mais Digital.
Foi um discurso histórico, no qual Marlon fez um balanço da resistência ao arbítrio, chamando todos os setores da sociedade para uma autocrítica e mostra a covardia institucional brasileira, de não acompanhar as decisões da Corte Internacional contra torturadores.
Por que não fomos capazes de resistir à ascensão do autoritarismo? Por que ficamos inertes ao avanço da tortura? Por que o Poder Judiciário e o Ministério Público não foram capazes de defender a Constituição?
Disse ele: "O primeiro passo para a ladeira escorregadia na qual o país caiu foi não reconhecer a Constituição. Independenrtemente de ideologias, tinha que se impedir que se rasgasse a constituição definida por Assembleia Constituinte. Quando se permitiu isso, o país foi ladeira abaixo e os brasileiros não conseguiram escapar da prática da tortura e dos atropelos dos direitos humanos".
Em seu discurso, relembrou o trabalho de advogados que defenderam presos políticos, não por honorários, mas correndo riscos em nome da dignidade da profissão.
A questão central é que, por trás dos fatos e episódios históricos, há o caráter humano, de personagens que atravessam sua trajetória profissional enganchando-se em todos os oportunismos. 
No distante ano de 1977, a OAB de Raimundo Faoro lutava pela volta do estado de direito; advogados de presos políticos corriam risco profissional defendendo direitos humanos; pastores, cardeais, rabinos se juntavam contra a tortura e em defesa da legalidade.
Na sala do MPF em São Paulo estavam antigos batalhadores, de Luiza Erundina e Aloyzio Nunes Ferreira.  Assisti a Marlon enaltecendo advogados como Sigmaringa Seixas e Luiz Eduardo Greenghalgh, Belisário e José Carlos Dias,  jornalistas como Ricardo Kotscho e Frei Betto.
Na outra ponta, juristas oportunistas, advogados oportunistas se valiam do momento para pavimentar sua carreira. Dentre eles, o jovem advogado Carlos Ayres Britto, que em um artigo de 1977 fazia uma candente defesa da primazia do AI5 sobre a Constituinte.
                                                                                              
Dizia ele:
"O último padrão legislativo (...) é qualificado de "autoritário" - que não se confunde com "arbitrário" - em confronto com o paradigma liberal da ordem constitucional. Entretanto (...) por se consubstanciar em esquemas normativos previamente estabelecidos, esse modelo não fere do Estado de Direito vigente no país".
"Todavia, a possibilidade de entrechoques (entre a ordem liberal e a autoritária) de prescrições é inevitável por incidirem, ambos os sistemas, sobre as mesmas pessoas e o mesmo território político. Nesse caso, um dos ordenamentos é necessariamente sacrificado , para que outro possa cumprir sua destinação histórica".
Nas conclusões finais, Ayres foi taxativo, de defesa do AI-5 "enquanto não se completar o ciclo de institucionalização da Revolução Democrática de 31 de março de 1964."
Ayres Britto fez sua aposta na ditadura e perdeu. Nos anos seguintes tornou-se petista e amigo dos defensores dos direitos humanos. Por compadrio com grandes juristas de esquerda, conseguiu de Lula a nomeação para Ministro da mais alta corte.
Lá, deu-se conta de que, depois da nomeação, devia loas a outros poderosos. O poder do presidente sobre o Ministro termina no exato momento em que o escolhido assume o cargo.
Votou contra a revogação da Lei da Anistia. No AP 470 percebeu que o verdadeiro poder estava na mídia, e tornou-se midiático.
Por isso, seria conveniente que se deixasse de lado o julgamento benevolente de Ayres de que sua mudança de atitude teria sido resultado do receio de que a mídia explorasse as estripulias de seu genro, oferecendo seus préstimos (dele, Ayres Britto) a políticos em dificuldades.
Ayres Britto é o que sempre foi.

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